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Covid-19: pandemia escancara disparidade social em bairros de Maceió

Dados evidenciam a marginalização de populações periféricas no acesso à saúde


Foto: Pâmela de Oliveira

Embora tenha começado como um surto elitista, contaminando os viajantes brasileiros de classe média-alta que voltavam das férias no exterior, a pandemia de Covid-19 se alastrou pelo mundo sem fazer distinção de classe, gênero ou raça.


Em Maceió este cenário não foi diferente. A capital alagoana registrou seu primeiro caso de contaminação pelo novo coronavírus em março de 2020, quando o país contabilizava, ainda, 24 casos e acreditava-se que a doença permaneceria em reduto das classes média e alta.


O paciente era um alagoano, de 42 anos, que acabava de retornar da Itália, onde, na ocasião, ficava um dos epicentros da contaminação no mundo. Morador de um bairro de classe média alta da capital, ele foi avaliado por uma equipe médica de um hospital da rede privada, segundo informações da Secretaria Estadual de Saúde (Sesau).


No entanto, meses depois, essa compreensão de que a doença afetaria apenas o público com acesso a hospitais e tratamentos de ponta — e em geral, de alto custo — já estaria completamente defasada. Quando se compara o primeiro caso confirmado e a primeira morte em decorrência da Covid-19 registrados em Maceió, as desigualdades começam a ser evidenciadas.


Ao passo de que o primeiro caso confirmado recebeu os primeiros atendimentos em uma unidade de saúde privada, a primeira morte se deu em uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), no bairro do Trapiche, região que três meses depois, em junho de 2020, já somava 117 óbitos pela doença, e abrigava a segunda maior taxa de letalidade dos distritos sanitários da capital.


Ao analisar as taxas de letalidade do 2º Distrito Sanitário de Maceió, que abrange o bairro do Trapiche, entre outros, ele se mantém como a localidade com o segundo maior número de mortes por Covid-19 entre os meses de Junho, Outubro e Dezembro de 2020, períodos mais críticos da pandemia, ficando atrás apenas do 7º Distrito Sanitário, que possui pouco mais que o dobro da sua população, segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde de Maceió.


Ambos os distritos contam com uma grande concentração de pessoas vivendo em situação de vulnerabilidade social e com grande carência de políticas públicas que ofereçam a seus residentes um acesso democratizado e eficaz à saúde, o que pode ter contribuído diretamente para as altas taxas de letalidade nas regiões.


O médico infectologista Fernando Maia atuou na linha de frente do combate à Covid-19 nos períodos mais críticos da pandemia e, atualmente, realiza atendimento a pessoas com diagnósticos positivos para a doença. Para ele, a falha na democratização do acesso à saúde é ponto decisivo na evolução da doença em pessoas que vivem em situação de vulnerabilidade social.


Fernando Maia. Foto: Ascom Ufal

“A dificuldade de acesso aos serviços de saúde pode contribuir decisivamente para a um desfecho ruim em casos de pessoas com contaminação pela Covid-19, que é uma doença muito democrática que atinge qualquer pessoas por acontecer através da transmissão respiratória. No entanto, pessoas que estão em situação de vulnerabilidade social e tem, portanto, maior dificuldade no acesso à saúde, podem ter dificuldade para conseguir o primeiro atendimento, fazer exames e internação, por falta de acesso”, revela.





Dados: Sesau/AL | Infográficos: Maíra Sobral


Porém, perto de completar dois anos de pandemia, o que os dados mostram é que o pé de igualdade forçado pelo vírus não é o mesmo quando se trata de quem sofre o maior impacto da doença nas diferentes regiões da capital.


Maior ilustração desse cenário é a Ponta Verde, bairro turístico da capital e ocupado por moradores abastados. Com letalidade em 2,1%, possui uma das menores taxas da capital. Parte do 1º distrito sanitário, o bairro basicamente não possui estrutura de saúde pública, já que não é definido como prioridade nas diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS) devido ao poder aquisitivo da população.


Em contraste, temos o Vergel do Lago, um dos que mais sofrem com a vulnerabilidade social na capital e um dos símbolos da pobreza no estado. Lá, a letalidade dobra para 4,1%. O abismo já foi maior, com momentos onde esse número chegou aos 6% como em novembro de 2020, quando sequer existia vacina no país.


Apesar dos esforços do poder público, como a instalação de um posto de vacinação no Papódromo, um dos cartões postais da região, a imunização não conseguiu compensar os meses de tratamento e acesso desigual à saúde, com disparidades que sobrevivem até os dias de hoje.


Essas desigualdades são evidenciadas quando se faz um comparativo acerca do atendimento prestado em unidades públicas e particulares. Mesmo com a sobrecarga que a pandemia de Covid-19 provocou superlotação de leitos em unidades de ambos os sistemas.


O publicitário José Roberto da Silva conta que, apesar de ter acesso à instituições de saúde privadas, teve atendimento negligenciado, mesmo apresentando de forma intensa sintomas característicos da doença. Entre idas e vindas à emergência de uma unidade de saúde privada, ele precisou buscar atendimento em uma outra instituição, foi quando teve diagnóstico de uma quase falência da função renal.


O publicitário José Roberto da Silva. Foto: Acervo Pessoal

“Quando procurei uma unidade particular para atendimento foi uma grande agonia, havia uma grande quantidade de pessoas também procurando atendimento, o que fez com que eu passasse três dias entre idas e vindas até o hospital, foi um grande sofrimento, porque mesmo com todos os sintomas de forma intensa não recebi o atendimento necessário. Foi quando decidi procurar por uma segunda instituição, também privada, e tive um atendimento satisfatório, com a realização de vários exames, que comprovaram uma quase falência dos rins em razão da contaminação por Covid-19 e logo fui internado”, relatou.


 



A desinformação teve um forte impacto na circulação do vírus em Maceió, no Brasil e no mundo. O jornalista Josenildo Torres, assessor da Secretaria de Saúde de Alagoas (Sesau/AL), fala sobre o problema no podcast.



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